A tensão de Oppenheimer é tão grande que a narrativa causa enjoo, misturada com apreensão e culmina em ansiedade gerada pela incerteza. O filme nos faz dar conta de que vivemos à sombra do poder de destruição que a arma que o físico Oppenheimer (interpretado pelo ótimo Cillian Murphy), conhecido como o pai da bomba atômica, ajudou a criar e capaz de destruir toda a existência do mundo.
Se você está se perguntando porquê fazer um filme sobre Oppenheimer, as respostas são encontradas no filme. Nolan oferece uma crítica moral bem construída, que vez ou outra pode esbarrar na sua própria mania de tornar tudo muito grandioso, mas é efetivo em seu propósito de mostrar a crueza por trás de uma criação científica tão perversa. Como realmente Oppenheimer discute no filme, o mundo se moldou completamente a partir disso.
O diretor traz essa complexidade que Oppenheimer é, seu conflito de desenvolver uma arma que ninguém sabia o tamanho do seu poder de destruição, mas compreendiam se tratar de um divisor de águas na corrida armamentista. Algumas vezes, Oppenheimer se torna exaustivo em meio a uma montagem que é elaborada demais quando poderia ser mais objetiva.
Ao mesmo tempo, a trilha sonora de Hans Zimmer Ludwig Göransson confere a tensão que a abordagem de Nolan necessita, se fundindo com o design de som para emular sons radioativos ou ao exibir perturbações da própria mente de seu protagonista.
Paralelo a isso, a narrativa de Christopher Nolan é um grande quebra-cabeça movido a jogo político e ambição. A guerra retratada nele funciona como um trampolim para personagens continuarem escalando na hierarquia e ocuparem cargos de destaque. A política revela o lado frio das decisões, seja de começar o Projeto Manhattan, e passa pela escolha de bombardeio às cidades, como se estivessem debatendo o que comer ou o que fazer em uma sexta à noite.
Em tudo isso, não poderia faltar as próprias contradições que Oppenheimer o tempo inteiro tenta enfrentar em seu interior. Isso se reflete quando Nolan nos faz sentir o que Oppenheimer está sentindo, como na cena em que ele discursa para toda a comunidade (que ele construiu) de Los Alamos, no meio do deserto americano, após os ataques bem-sucedidos em Hiroshima e Nagasaki, ou quando ele se sente acuado, exposto e Nolan o desnuda completamente.
Não há santos na história e Oppenheimer nos livra disso ao não perder tempo discutindo se os personagens sabiam o que estava fazendo ou não. Lógico que tinham conhecimento, movidos também pela possibilidade do inimigo estar mais avançado que eles no desenvolvimento de uma arma tão poderosa que poderia ser usada contra os Aliados (leia-se: EUA).
O filme, no final, não tenta justificar porque conhecemos a história: o ataque às cidades de Hiroshima e Nagasaki foi desnecessário, uma vez que o Japão estava prestes a se render. É uma demonstração de força. Oppenheimer percebe isso e advoca pelo uso limitado da arma nos anos seguintes à guerra.
Uma luta que o mundo trava até os dias de hoje, sem garantia de que algo similar não aconteça novamente.
(Errata 02/08/2023 — A trilha sonora não foi composta por Hans Zimmer, mas sim por Ludwig Göransson).
Texto originalmente publicado na newsletter Sob a Minha Lente (link).