‘Ficção Americana’ se equilibra com inteligência entre drama e sátira

‘Ficção Americana’ se equilibra com inteligência entre drama e sátira

Thelonious Ellison (Jeffery Wright) atingiu aquele ponto de inflexão na carreira como professor e autor de livros. Quando o vemos em uma das primeiras cenas de Ficção Americana (disponível no Prime Video), estreia na direção de Cord Jefferson e baseado no livro “Erasure” escrito por Percival Everett, ele está totalmente surpreso pelo sucesso literário fictício de “We’s Lives in Da Ghetto”, escrito por uma nova autora interpretada por Issa Rae.

Ao contrário dos livros que Ellison escreve, este parece ter capturado o espírito da cultura preta de uma forma que os livros de Ellison, precisamente bem escritos e eruditos para um público que não está interessado nesse tipo de forma, está lá empoeirado nas livrarias em alguma seção de história e não literatura.

Ficção Americana move de um drama sobre as dificuldades desse professor para uma sátira, quando ele assume um pseudônimo e escreve o livro intitulado “My Pafology” após o seu editor lhe dizer que as suas histórias não são “pretas o suficiente”. Ellison não tinha qualquer ambição com a história, mas a trama envolvendo gângsteres e pais ausentes, em meio à descoberta da identidade preta, ganha popularidade e ele se vê na encruzilhada de se manter fiel ao personagem que criou para conseguir escrever o livro ou se entregar e dizer que tudo não passou de uma brincadeira de mal gosto.

Cord Jefferson equilibra bem o filme entre a sátira e o drama, sabendo dosar com sequências que apresentam a dinâmica familiar de Ellison, principalmente seu relacionamento com o irmão Clifford (Sterling K. Brown, em ótima atuação). Nesse sentido, Jefferson aborda a história com planos mais intimistas, deixando mesmo os atores e o texto ganharem destaque.

E Jeffrey Wright aproveita isso para construir um personagem cuja complexidade é um mistério. Parece até que Thelonious foi escrito para ele, porque é impressionante como Wright está confortável e seguro no papel – e o mesmo vale para o próprio Jefferson, cuja habilidade de mover a narrativa com confiança também merece aplauso.

Vencedor do Prêmio do Público no Festival de Toronto de 2023, Ficção Americana merece elogios também por não aproveitar a trama para ter grandes pretensões que não se encaixariam na história. O trunfo do filme está mesmo no carisma dos personagens e na crença de ter uma boa história para contar nas mãos. O resultado é um filme agradável, leve e que eleva o humor do espectador.