Elis e Tom é o típico documentário de bastidores da gravação de um álbum que se tornou clássico. Porém, como também aconteceu na experiência de assistir Get Back, dirigido por Peter Jackson, esse trabalho roteirizado por Nelson Motta e Roberto de Oliveira oferece a experiência de olhar intimamente para esse processo de realização do disco, em imagens que se misturam com arquivos filmados da época e entrevistas atuais com músicos envolvidos diretamente com a obra.
O resultado é que assistimos Elis Regina e Tom Jobim fazendo música juntos ao mesmo tempo que pairava uma certa tensão no ar: Jobim queria ter o controle criativo sobre o disco uma vez que suas composições e arranjos seriam regravados, enquanto que Elis Regina experimentava dúvidas e também não queria participar de um projeto que a sufocasse (ou a amarrasse) como artista.
Em certo modo, esse era o grande problema da época para Elis Regina, cuja carreira estava em declínio em razão de algumas decisões equivocadas – a principal, de participar de um evento promovido pelo exército. A esquerda criticou e muito, pois a ditadura mirava justamente a censura à cultura.
O disco Elis e Tom nasce, então, da tentativa da gravadora Polygram de homenagear Elis pelos dez anos de carreira, aproximando ela de Tom Jobim para transferir o prestígio que Tom tinha na época.
Mas o documentário deixa dúvidas quanto a isso. Tom Jobim tinha sim muito prestígio, mas internacional. No Brasil, o público não o reconhecia como o gênio que era. Ele se incomodava com isso e se mudou do país, indo morar em Los Angeles (cidade onde o disco acabou sendo gravado).
Outro ponto que gera polêmica em Elis e Tom é quando o filme tenta vender a ideia de uma rivalidade entre os dois – o que é descartado pela própria Elis, em uma entrevista recuperada no filme e que contradiz o depoimento de uma figura central no documentário (e em todo o projeto).
Apesar disso, essa possível rivalidade gera cenas engraçadas para quem assiste hoje mas que na época eram realmente motivos de tensão. Em um determinado momento, Tom fala que quando descobriu que iria ter violão elétrico ele quis congelar o avião que trazia Elis e equipe à Los Angeles.
Pessoas ao redor de Tom riem, mas é aquela risada de nervoso, de desespero. Diferente da nossa, enquanto audiência, que rimos apenas pelo prazer de ver o processo criativo de dois gênios se desenvolvendo bem ali.
Texto originalmente publicado na newsletter Sob a Minha Lente (link)