‘Expatriadas’ explora Hong Kong e a complexa vida dos personagens

‘Expatriadas’ explora Hong Kong e a complexa vida dos personagens

Uma das coisas mais fascinantes no filme A Despedida (2019), quando a diretora Lulu Wang fez a sua estreia, é o fato dela olhar para questões familiares com tamanha sensibilidade e humanidade, ao mesmo tempo que trata do choque cultural de uma garota americana (mas com raízes chinesas) voltando ao seu país natal com tanta experiência diferente em relação aos seus familiares.

Assim como em A Despedida, Lulu Wang trata em Expatriadas (minissérie de seis episódios disponível no Prime Video) de personagens deslocadas, sem nenhuma referência que os remeta à uma casa. Adicione a isso um tom de mistério que impacta a vida de três mulheres e chegamos à uma combinação ainda mais interessante.

Baseado no romance escrito por Janice Y.K Lee, Expatriadas acompanha três mulheres de raízes americanas que, por decisão delas ou não, vivem em Hong Kong – ou seja, são imigrantes em outro país com uma cultura completamente diferente.

Margaret Woo (Kidman) é uma dessas mulheres. Ela mora no bairro mais rico de Hong Kong, mãe de três filhos. O mais novo, porém, desapareceu e após meses de buscas pela polícia local sem respostas, ela vive obcecada em encontrá-lo. Sua vizinha, Hilary (Sarayu Blue) é outra mulher rica e com problemas no casamento – o marido quer ter filhos, ela não. Já Mercy (Ji-young Yoo) está em outro espectro, vive de bicos, mora em um apartamento minúsculo e está em Hong Kong para recomeçar.

A trama que se desenrola a partir dessas três mulheres, e como as vidas delas se interconectam, é o suficiente para prender a atenção. Mas existem outros elementos cativantes que contribuem para isso. Um deles é a direção de Lulu Wang, cuja abordagem faz com que as cenas durem sempre um pouco mais, segurando a câmera por um tempo maior e esse atraso permite que o espectador disseque mais os personagens e onde eles estão antes do corte.

Além de funcionar bem tecnicamente, Wang coloca em Expatriadas fatores sociais e políticos que enriquecem a trama. Vemos a (imigrante) elite dando festas grandiosas enquanto são servidos pelos locais – que, além de ganharem mal e estarem sempre disponíveis, ainda acumula tratamentos ruins.

É criativo, e também elegante, quando Wang faz questão de filmar o caminho até a casa de Margaret e Hilary, subindo uma grande ladeira que só reforça – e serve de metáfora – para a desigualdade que a série observa.

Por outro lado, no final de um dos episódios, sua câmera estática observa uma das ruas mais movimentadas e vibrantes de Hong Kong, tomada por uma classe trabalhadora que cozinha, vende de tudo e que irá protestar (juntamente com os estudantes) contra o governo a favor de mais democracia (movimento que ficou conhecido como Revolta do Guarda-Chuva) que aconteceram em 2014, ano no qual a narrativa está ambientada.

Existe, portanto, uma efervescência social e política impossível de se dar as costas. Esses efeitos fazem com que Expatriadas amplie o foco principal da narrativa da série, compreendendo que existe trauma, luto e culpa permeando a história – mas que é possível ir mais além para trazer outros conflitos.

No final, essa observação serve para Expatriadas se afastar um pouco do melodrama, apesar de voltar algumas vezes, o que (cá entre nós) é sempre chato de assistir.