Quando damos play em Mestres do Ar, nova série da Apple TV+ e produzida por Tom Hanks e Steven Spielberg, já esperamos aquele tom piegas que dá certa agonia presente nas “séries-irmãs” Band of Brothers e The Pacific, ambas no catálogo da HBO Max (que no final de fevereiro se chamará apenas Max). Logo de cara existe esse pacto: é de conhecimento público que a série vai puxar para esse lado e esperamos que em algum momento ela capture a nossa atenção.
O problema, porém, é que Mestres do Ar falha nessa captura apesar de se esforçar bastante para nos engajar – e aí quebra o nosso acordo de não nos importarmos e assistirmos a ação. Acompanhando um esquadrão responsável por missões de reconhecimento e bombardeio no território do inimigo durante a Segunda Guerra Mundial, parte desse problema está nos personagens principais.
Os Majores, e melhores amigos, Gale Cleven (Austin Butler, em piloto automático) e John Egan (Callum Turner, um pouco mais expressivo) lideram o batalhão e parte da narrativa é concentrada neles. Mas o elenco é amplo (algo comum em produções de guerra), como nas outras séries, e não dá muito tempo para sentirmos empatia por eles – por mais que a narrativa seja ambientada em meio a um conflito.
Quem acaba se tornando mais interessante é alguns personagens que estão no elenco de apoio, como o chefe dos mecânicos responsável por fazer a manutenção nas aeronaves e limpar a pista após as decolagens ou o navegador, Crosby (Anthony Boyle), cujos enjoos por voar rendem boas sequências de tensão e revelam conflitos muito mais importantes do que aqueles apresentados para Cleven e Egan.
Um outro problema apresentado nos dois primeiros episódios disponíveis no streaming da Apple TV+ é o fato de Mestres do Ar perder muito tempo em sequências que claramente não nos levam a lugar algum. Há uma cena no primeiro capítulo de um pouso mais complicado da aeronave, e a série cria uma tensão desnecessária como se um acidente fosse acontecer a qualquer momento – o qual não se justifica considerando que a tripulação era formada por uma parte dos protagonistas.
Igualmente desimportante é quando os comandantes reúnem o pessoal para passarem as diretrizes da missão. Muitos termos técnicos e explicações que o espectador não se importará quando a ação começar. E nisso o diretor Cary Joji Fukunaga (007 – Sem Tempo para Morrer), que admiro por trabalhos em True Detective, 007 e Beasts of No Nation, poderia entregar mais dinamismo e trazer alguma linguagem que já vimos em seus trabalhos anteriores.
Para não dizer que Mestres do Ar é uma enorme decepção, as sequências de ação tem um bom mérito do Fukunaga ao não torná-las confusas e delimita bem o espectador e o espaço no qual os cortes se passam. E isso mesmo com muitos personagens usando máscaras e com modelos de cabelo iguais, o que sempre dificulta saber quem é quem em filmes de guerra – até hoje tenho dificuldades para identificar Josh Hartnett e Ewan McGregor no ótimo Falcão Negro em Perigo (2001), um dos meus filmes favoritos desse gênero.
Enquanto tecnicamente Mestres do Ar entrega e narrativamente falha em muitos momentos, existe algo que a série faz bem que é retratar a irmandade (e importância dela), chegando a um batalhão atrasar o ritmo apenas para assegurar que outra aeronave, com três motores perdidos e apenas um funcionando, consiga pousar em segurança em algum país fora das linhas inimigas.
Mestres do Ar retrata bem essa amizade e camaradagem, mas cai na armadilha (desculpa o trocadilho) ao não conseguir trazer nenhuma perspectiva crítica à forma como as operações são feitas, se inocentes eram mortos. O que importa é se pilotos e tripulação voltam salvos. Os alemães, e os países do Eixo, são os vilões. Então que sejam mortos. É muito maniqueísta só pensar assim.
Essa falta de humanidade incomoda em Mestres do Ar. Talvez por isso eu tenha gostado tanto de Crosby, um personagem com problemas de insegurança, medo e que justamente adiciona esse elemento humano que não aparece nos episódios.