Rever ‘Mad Men’ é entender como a série se transformou em fenômeno cultural

Rever ‘Mad Men’ é entender como a série se transformou em fenômeno cultural

“Quem é Don Draper” é a sentença que abre a quarta temporada de Mad Men, uma das mais complexas e bem elaboradas de toda a série. A pergunta é feita por um jornalista a Don Draper, que começa a suar frio sem saber o que ou como responder. Ele sai pela tangente, com a mesma habilidade de sedução que ele usa para se aproximar das mulheres com quem deseja ter alguma relação.

Querendo ou não, essa é a mesma pergunta que nós, espectadores, nos fazemos desde o início quando somos apresentados ao personagem vivido por Jon Hamm. Don, aparentemente, tem tudo (uma linda família, linda casa, lindos filhos, trabalho que paga bem), ao mesmo tempo que não tem nada.

É ainda mais claro perceber isso ao notar o vazio na sua vida na quarta temporada: recém-separado de Betty, longe dos filhos, morando em um apartamento escuro e pequeno no centro de Nova York e não mais na comodidade do subúrbio, trabalho em uma agência completamente reformulada e, cada vez mais, se entregando à bebida e às mulheres (qualquer uma que aparecer).

Nem mesmo o sucesso é capaz de consolar Don. Assim, a quarta temporada é uma montanha-russa de emoções para o protagonista, provocada por essas grandes mudanças. Aliás, isso se reflete também na experiência que se tem ao assistir cada episódio, pois é imprevisível compreender a direção que Mad Men pretende tomar, uma vez que a série como a conhecíamos nas três temporadas anteriores simplesmente não existe mais.

Mad Men mostra Don, e seus principais personagens, mais frágeis e em crises existenciais, se questionando o lugar deles no mundo – pessoalmente e profissionalmente. Por isso a quarta temporada é tão rica, resultando em um pacote de grandes episódios.

Um deles é “The Suitcase”, focado na relação de Don com seu passado e como ele é forçado a enfrentar isso. O capítulo se destaca pelo equilíbrio entre o desespero de Draper de ver uma importante parte da sua vida indo embora e outra que reside na sua habilidade de criar campanhas e histórias para os clientes – neste caso, um anúncio para a Samsonite que ele e Peggy precisam inventar.

A quarta temporada é o trampolim para Mad Men mergulhar ainda mais no estudo de personagem que é Don Draper. Um recomeço que tira a audiência e os personagens do lugar comum para desbravar novos territórios, conflitos e enriquecer uma trama que nunca foi simplória – mesmo quando o objetivo era apenas narrar o cotidiano dos publicitários que povoavam as agências na Madison Avenue.

No fim, Mad Men entrega uma das melhores temporadas. E não apenas da série, mas também da televisão moderna.

Texto originalmente publicado na newsletter Sob a Minha Lente (link)